Neste texto, buscamos
enfatizar descrições dadas por pesquisadores importantes dos gêneros aqui
abordados: Batuque e Lundu. Veja o que diz Johann Moritz Rugendas (1802-1858):
A
dança habitual do negro é o batuque. Apenas se reúnem alguns negros e logo se
ouve a batida cadenciada das mãos; é o sinal de chamada e de provocação à dança.
O batuque é dirigido por um figurante; consiste em certos movimentos do corpo
que talvez pareçam demasiado expressivos; são principalmente as ancas que se
agitam, enquanto o bailarino faz estalar a língua e os dedos, acompanhando um
canto monótono, os outros fazem círculos em volta de dele e repetem o refrão (RUGENDAS,
1979, p. 279).
Batuque. Johann Moritz Rugendas, Viagem pitoresca através do Brasil, 1835.
Através dessa descrição,
podemos notar que o batuque não necessita de instrumentos musicais para
acontecer, apenas a batida das mãos marcando o ritmo e a cantilena entoada em
grupos era suficiente. Porém há outra descrição dada pelo francês G. W.
Freireyss que se diferencia um pouco desta. Durante sua estada no Brasil entre
1814 e 1815, o viajante constatou que:
Entre
as festas merece menção a dança brasileira a Batuca o (batuque). Os
dançadores formam roda e ao compasso de uma guitarra (viola) move-se o dançador
no centro, avança e bate com a barriga na barriga de outro da roda, de ordinária
pessoa de outro sexo. No começo o compasso da música é lento, porém, pouco a
pouco aumenta e o dançador do centro é substituído cada vez que dá uma
umbigada; e assim passam noites inteiras. Não se pode imaginar um dança mais
lasciva do que esta, razão porque tem muitos inimigos, especialmente entre os
padres. (FREIREYSS, 1906, p. 214.)
É quase unânime entre os
pesquisadores de nossa música popular a aceitação de que o batuque original dos negros gerou o lundu a partir da adaptação da coreografia de danças ibéricas, em
especial o fandango, até mesmo com a
incorporação de instrumentos como o berimbau, marimba, tambores, chocalhos,
reco-recos.
A mais antiga referência
documental ao lundu data de 10 de junho de 1780 e já faz menção à semelhança
com o fandango. Trata-se de uma carta do conde de Pavolide, D. José da Cunha
Grã Athayde e Mello, em que responde ao ministro Martinho de Mello e Castro
sobre uma denúncia de que em Pernambuco eram cultivadas “danças africanas que
vinham já de remotas épocas” e consideradas “torpes e escandalosas” aos bons
costumes.
Essa semelhança de
coreografia foi mencionada por diversos viajantes, em diferentes locais e
épocas. O inglês Thomas Lindley, quando presenciou uma dança de negros na Bahia
afirmou que a coreografia era um “misto
de dança da África e fandango da Espanha e Portugal”.
No Rio de Janeiro, uma
segunda gravura de Rugendas retratando o lundu nos mostra um casal branco
executando passos da dança, rodeado por várias pessoas de sua cor e também por
negros. Chama-nos a atenção o movimento dos quadris da dançarina e as castanholas nas mãos de seu par. No
registro escrito, Rugendas identifica ainda a semelhança da coreografia com as
danças ibéricas:
Outra
dança negra muito conhecida é o “lundu” também dançada pelos portugueses, ao
som do violino, por um ou mais pares. Talvez o “fandango”, ou o “bolero”, dos
espanhóis, não de passem de uma imitação aperfeiçoada dessa dança. (RUGENDAS,
1979, p. 280).
Outro aspecto da dança do lundu, registrado por Rugendas,
desta vez em habitações de escravos, também no Rio de Janeiro.
Nas últimas décadas do
século XVIII, já consolidado como dança, é que o Lundu foi aos poucos sendo
aceito pelas classes sociais dominantes, ultrapassando os limites dos
territórios e ganhando os salões encerados das casas da aristocracia local.
Referências:
FREIREYSS,
Georg Wilhelm. “Viagem ao interior do Brasil nos anos de 1814-1815” (tradução
de Alberto Löfgren), Revista do Instituto
Geográfico de São Paulo, São Paulo, v. 11, p. 214, 1906.
RIBEIRO, André. A Música na Corte de D. João
VI. Coordenação: Paulo Roberto
Pereira, 1ª ed. São Paulo: Editora
Martins, 2008.
RUGENDAS,
Johann Moritz. Viagem pitoresca através
do Brasil. (tradução de Sérgio
Milliet), 8ª ed. São Paulo: Edusp, 1979.
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