quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Quais as características das danças: Batuque e Lundu


Das manifestações dos negros, o batuque era a mais comum; era, segundo Rugendas, a dança habitual e que continha seus rituais próprios. Começava com a reunião de alguns negros, depois vinha um sinal “a batida cadenciada das mãos” e logo se iniciava a dança.
Muitas vezes confundido com o lundu, o batuque era uma dança que tinha tanto de tolerável quanto de reprovável. O próprio Rugendas chama a atenção para os movimentos do corpo “demasiado expressivos” onde principalmente “as ancas se agitam”. Os dançarinos do batuque, normalmente um casal que se agitava esfregando os umbigos um no outro, foram motivos de reprovação de muitos conservadores brancos da colônia.
O batuque era frequente em espaços afastados, como nas fazendas menores e nas roças, distante dos olhares às vezes reprovativos dos brancos. A tolerância era visível, mas as sanções e as posturas das câmaras municipais do Brasil muitas vezes mencionavam os batuques como ajuntamentos perniciosos.
Nos momentos em que essas danças eram praticadas por brancos, pode-se imaginar uma adaptação, como, por exemplo, modificar ou suprimir a coreografia, deixando simplesmente o ritmo e a melodia.
A obscenidade não estava na musicalidade, mas nas alusões espontâneas da sexualidade. As danças e as suas coreografias eram um atrativo exótico para os estrangeiros.
O Batuque com seu ritmo sincopado é uma dança de origem africana, do ritual da procriação, foi também severamente proibida na época colonial pelos padres. Dança muito popular em algumas cidades do interior de São Paulo, nas festas do Divino Espírito Santo, ou nas festas juninas.
O batuque é dançado em terreiro ou praça pública. Uma fileira de homens fica ao lado dos tocadores, as mulheres ficam a uns 15 metros de distância. Então, começa a dança, começam as umbigadas. Cada homem, dançando, dá três umbigadas numa mulher. Os músicos tocam. Um batuqueiro "modista" faz a poesia, os versos, há o solo, em seguida, o coro é feito por todos que estão batucando.
A música, o canto e a dança, sempre estiveram e estão muito presentes entre os primeiros habitantes desta terra. Inclusive eles fabricavam alguns instrumentos musicais, hoje considerados toscos, que ainda podem ser encontrados em festas folclóricas, portanto nas celebrações, a experiência musical dos indígenas brasileiros foi apenas prestada a esta bendita mestiçagem, que chamamos hoje de cultura popular brasileira.
Como sabemos, o lundu é dança e canto de origem africana, que veio para o Brasil com os negros de Angola, por duas vias, passando por Portugal, ou diretamente da Angola para o Brasil. Em Portugal recebeu polimentos da corte, com o uso dos instrumentos de corda, mas fora proibido por D. Manuel ao ser “contrário aos bons costumes”. Já a vinda direta da Angola para o Brasil recuperou o acento jocoso, mordaz e sensual que incomodara a sociedade lisbonense.
Ritmos e temas como a música negro/africana marcam presença nítida e permanente em nosso repertório. Nos três primeiros séculos de colonização, o que existiu foram bem definidas e isoladas formas musicais. O canto para as danças rituais dos índios e os batuques dos escravos, a maioria também ritual.
Em outros extremos do cotidiano, sem se misturarem as cantigas dos europeus colonizadores que tinham origem nos burgos medievais do século XII a XIV, justamente quando a música dessacralizou-se, ou escapou das igrejas e da ordem unida e ganhou as rodas públicas, é que se pode começar a falar em uma música popular brasileira, quando se mesclou com apetência e liberdade.
Um dos mais antigos registros de canto popular é do grande poeta satírico: Gregório de Matos Guerra, que mesmo já velhote tentava seduzir as escravas mais agradáveis, cantando versos frascários ao som de uma viola de arame, aperfeiçoando o lundu, tão em voga na Colônia, sendo esse de origem portuguesa ou quimbunda (língua banta de Angola). Essa e outras danças populares portuguesas que haviam sido condenadas pela Inquisição e pelos jesuítas conservaram-se com toda a sua pujança no Brasil, sobretudo na época de Gregório.
O lundu era uma dança dengosa, cantada e executada com todos os ritmos e voluptuosidades da coreografia. Entre todo o folclore nacional o lundu é a melhor forma de manifestação do tropicalismo dos mestiços e a expressão mais viva do sensualismo das mulatas eróticas e ciosas. Quando os mais modestos, “as classes perigosas” como eram chamados pelas elites, se divertiam, podia virar até caso de polícia.
O lundu na sua origem tinha sistemática simples, a qual ainda pode observar na dança de roda, sua familiaridade. Músicos iniciam o ritmo lundu. As pessoas que querem dançar aproximam-se, já entrando na dança. Um sinal da viola é emitido e a primeira dançadora abre espaço no centro da roda que logo se forma com o grupo.
Forma-se a roda, e a dançadora permanece no centro dançando até convidar alguém para substituí-la, o convite pode ser uma batida de pé diante da pessoa, palmas diante da pessoa, uma umbigada ou um toque de ombros à esquerda e em seguida outro à direita, a dançadora convidada vai para o centro dançar, dança no centro até escolher quem vai substituí-la. Pode ser uma mulher ou um homem, portanto as substituições continuam por várias vezes.
Quando está no meio da roda, o dançador faz evoluções inteiramente relaxado, braços caídos ao longo do corpo, pernas meio fletidas, mantendo um sapateio em que a planta do pé bate inteiramente no chão, ao ritmo da música. A predominância dos dançadores é de mulheres. Homens em geral ficam apenas olhando ao redor, mas ao serem convidados, vão para o centro dançar. Se ao sair convidam uma dançadora com umbigada, faz-se grande algazarra no grupo.
Não se registra umbigada de homem em homem, mas entre mulheres há umbigada indistintamente em outra mulher ou em homem. Quando a umbigada passa a se disfarçar como simples mesura, o lundu ensaia sua entrada nos salões da sociedade colonial. “Havia mulatos célebres, aplaudidos nos salões por darem ao lundu um acento libidinoso como ninguém: era uma feiticeira melodia sibarita, em lânguidos compassos entrecortados, como quando falta o fôlego, numa embriaguez de sensualidade voluptuosa.” (MARTINS, 1920).
Um dos mais antigos registros musicais desse tipo de dança encontra-se nas Canções populares brasileiras e melodias indígenas, recolhidas no Brasil por Martius entre 1817 e 1820. Uma das peças é o “Landum, Brasilianische Volktanz”, composição na qual um pequeno motivo, construído sobre as harmonias de tônica e dominante, é executado em forma de variações.

Referências:

ALBIN, Ricardo Cravo. O Livro de Ouro da MPB. 4ª ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.

MARTINS, J. P. Oliveira. História de Portugal, vol. II, Lisboa: Parceria A. M. Pereira, 1920.

MONTEIRO, Maurício. A Construção do Gosto: Música e Sociedade na Corte do Rio de Janeiro – 1808 - 1821. 1ª ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2008.

MUKUNA, Kazadi Wa. Contribuição Bantu na Música Popular Brasileira. 1ª ed. São Paulo: Global, 1979.